terça-feira, 10 de março de 2009

Um amor

Ultimamente tenho sentido saudades. Não que em outros tempos não sentisse, mas ela está mais forte. Talvez seja por causa deste turbilhão de coisas que vem acontecendo na minha vida. Mas a verdade é que minha vó Anna faz muita falta.

Tinha os olhos azuis que tinham a capacidade de sorrir. A pele bem branca com sardas mostrava as marcas de uma vida de luta desde muito cedo.

Suas mãos eram grandes, pareciam até desajeitadas, mas eram firmes e delicadas, capazes de realizar trabalhos cheios de detalhes. Lembro-me das pequenas rosas de “glacê real” que ela fazia naqueles bolos de casamento, que demorava dias para confeitar.

Nas horas de folga, as do cafezinho, tinha sempre um cigarro, longo, nas mãos, que ia fumando e jogando as cinzas na palma da mão.

Lembro da minha ansiedade para que as férias chegassem logo e eu pudesse ficar com ela um mês inteirinho. Nos armários latas de leite condensado, creme de leite, milho verde e outras coisas que “as meninas” gostavam. Coisas que não faziam parte do dia a dia dela e que eram estocadas durante meses. Na geladeira dos fundos umas boas dúzias de tubaína. E na geladeira “principal” torta mesclada, doce de abóbora, doce de cidra e outras guloseimas que só ela era capaz de fazer. Ela sempre mandava fazer vestidos novos pra gente. Cheios de babados, bolinhas ou de florzinhas. Parecíamos bonecas de louça. No dia em que ela ia receber a aposentadoria era uma festa, saíamos as quatro (ela, minhas irmãs e eu). Era dia de sorvete e de ir ao cinema. Víamos os filmes dos trapalhões, quando ainda eram 4. Seu sorriso era largo. Não havia quem não se encantasse com a dona Anna.

Quando fui morar sozinha por várias vezes ela aparecia de surpresa com um tupperware cheio de salgadinhos, fresquinhos e ainda quentes. Chegava com a boca seca, pedia uma água, chupava uma balinha e voltava pra sua casa. E quantas vezes não pude retribuir atenção que ela me dava, afinal de contas eu era muito ocupada, estava estudando, tsã. Mas ela nem ligava voltava sempre para ver sua menina.

Ela me ensinou a fumar, a cozinhar, bordar, fazer tricô, crochê e principalmente algumas coisas sobre avida. Quando eu ia chegar tarde da faculdade me esperava acordada pra fritar meu peixinho, bater um papinho, fumar um cigarrinho, saber das novidades e darmos umas gargalhadas juntas. Falava alto, tinha a voz forte e quando estava nervosa ou muito feliz soltava umas frases em italiano, não negando sua origem. Tinha milhões de histórias para contar, umas tristes, outras mais alegres, mas sempre interessantes. Mas estas são para ser contadas em outras ocasiões.

Hoje gostaria que ela pudesse ver a mulher que me tornei. Gostaria que ela compartilhasse das minhas alegrias, das minhas conquistas, que estivesse aqui, mas acredito que o barbudinho sabe o que faz!

Minha história com a Vó Anna é de amor, daquelas que o tempo não deixa a gente esquecer, que de alguma maneira ficam gravadas para a eternidade. Meus filhos conhecerão a vó Anna e os filhos dos meus filhos também.